AJUDA O TABACO NO STRESS?

O tabaco tem sido visto por muitos como uma ajuda para lidar com o stresse da vida. As sensações que se conseguem com o seu uso levam as pessoas a puxar, automaticamente, de um cigarro para responder a situações de stresse (um exame, um acidente, uma má notícia) criando-se um ciclo vicioso entre estas e o cigarro. No entanto, quanto mais investigação se realiza sobre os efeitos do tabaco no organismo, mais as conclusões apontam para outros problemas além daqueles que são, tipicamente, associados ao cigarro – como é o cancro do pulmão, da laringe, etc. – abrindo, assim, uma reflexão mais alargada sobre estes malefícios. A questão que se coloca aqui é perceber que, ao contrário da crença comum, o tabaco não ajuda a gerir o stresse. Antes pelo contrário, ele é uma fonte de perturbação para um organismo que está a braços com uma fonte de stresse. Como a vida na actualidade é marcadamente stressante, alguém doente do tabagismo estará em piores condições para gerir o stresse, do que alguém que não está afectado por essa doença. Queremos aqui ajudá-lo a curar-se dessa doença, facilitando a gestão do stresse da vida.

Luís S. Nunes

O stresse, propriamente dito, não é um acontecimento em si mesmo. Não é um cão a ladrar, um carro a buzinar, um bebé a chorar ou um pneu furado. Não é um patrão a ralhar ou uma zanga com o seu cônjuge. Em vez disso, o stresse depende da forma como responder a esses acontecimentos e situações. Qualquer acontecimento, situação, ou até pensamento, que possa despoletar o stresse é chamado “stressante”. E um stressante faz, normalmente, surgir emoções como preocupação, ansiedade, frustração, alarme, medo e raiva. O facto do stresse ser sentido ou não, depende da forma como abarcamos a situação. O que provoca stresse numa pessoa, poderá ter pouco ou nenhum efeito noutra.Do stresse aos stressores
    Embora muitas vezes associemos o stresse com acontecimentos importantes, como a morte ou um acidente, são normalmente as pequenas perturbações do dia-a-dia que levam, eventualmente, a problemas persistentes e dificuldades. Tem muito menor efeito a queda de um avião, acontecimento devastador, mas inesperado e repentino, do que a presença de algo que, durante anos, nos perturba, sem que sejamos capazes de interromper o seu efeito na nossa vida. Pense nesta lista de stressantes, tanto pequenos como grandes, que cada um de nós tem de enfrentar um dia após outro: um atacador partido, um cão a ladrar, torneiras a pingar, um cônjuge que ressona, uma agenda preenchida. Agora, em contraste, os stressantes maiores incluiriam um acidente grave, a perda de um emprego, problemas financeiros, um divórcio, uma doença dolorosa, e a morte de um ente querido ou amigo íntimo. Mas, lembre-se, o stresse depende da sua resposta, e a resposta depende da forma como compreende a situação. Por exemplo: para alguns, um grito agudo a meio da noite é uma irritação que precisa de ser anulada imediatamente; para outros, é uma doce melodia assinalando que um filho querido está a pedir amor. 
    Ambos são confrontados com a mesma situação, mas as suas respostas são diferentes! Portanto, a quantidade de stresse emocional também o é.
Foge ou fica e luta
  Isto deve-se ao facto de que qualquer stressante, quer menor, quer maior, põe o corpo em estado de alerta. Fisiologicamente, é chamado “resposta luta ou foge”, uma vez que prepara o indivíduo para ou ficar firme e lidar com o problema, ou escapar dele.
    Esta reacção de alarme causa profundas mudanças no corpo. Poderemos ficar pálidos à medida que a circulação sanguínea deixa a pele para se dirigir aos órgãos internos. A tensão arterial sobe e o coração bate mais forte. A respiração torna-se mais rápida e poderá ser irregular.
    A gordura e o colesterol no sangue sobem. Aumenta o açúcar no sangue. Os músculos tornam--se mais tensos. A coagulação do sangue torna-se mais rápida. Entretanto, as funções orgânicas que não são necessárias para lidar com a emergência abrandam ou podem até parar temporariamente, tais como a digestão de alimentos nos intestinos ou a eliminação de resíduos através dos rins.
    Portanto, o stresse deveria ser apenas uma resposta de emergência para preparar o corpo para alguma acção defensiva imediata numa situação grave. É claro que o stresse não deveria ser permitido como resposta apropriada para o choro de um bebé, um atacador que se parte, ou um cônjuge a aborrecer-nos.

Mas, lembre-se, o stresse depende da sua resposta, e a resposta depende da forma como compreende a situação. Por exemplo: para alguns, um grito agudo a meio da noite é uma irritação que precisa de ser anulada imediatamente; para outros, é uma doce melodia assinalando que um filho querido está a pedir amor.

A resposta fisiológica aos stressores
 Quando uma situação stressante termina, o corpo irá, gradualmente, voltar ao normal. A pressão sanguínea baixará. O coração e a respiração normalizarão a sua velocidade e ritmo. O colesterol e o açúcar no sangue voltarão aos seus níveis normais, e os músculos relaxar--se-ão e descansarão. Entretanto, os sistemas digestivo e urinário retomarão as suas responsabilidades.
    Mas, e se o acontecimento que despoletou o stresse continuar? O corpo tentará ajustar-se ou adaptar-se à situação. Contudo, isso poderá levar a alguns problemas físicos ou emocionais graves.
    A mulher acaba de saber que o marido teve um acidente grave e está agora na sala de emergências. A ansiedade daí resultante manterá a sua tensão arterial elevada, o seu coração a bater mais depressa, e o açúcar no seu sangue mais alto. Ficará mais tensa e poderá sentir um aperto no peito e um nó no estômago. Quanto tempo poderá o corpo permanecer neste estado de emergência? 
    Se a Maria souber que a vida do João está em perigo, a intensidade do seu stresse aumentará e ela só se poderá adaptar a ele durante um curto período de tempo.
    Por outro lado, se souber que o marido só tem pequenas escoriações, então só ocorrerão mudanças físicas moderadas, que ela poderá manter por um período mais longo.
    O nosso corpo tem uma tremenda capacidade de se ajustar às preocupações do dia-a-dia. Podemos manter esse estado de stresse durante dias, semanas ou, por vezes, até meses sem que se mostre, exteriormente, qualquer prova da luta interior.
    Uma pessoa em boa forma física, e emocionalmente estável, será muito mais capaz de aguentar pressões do que alguém que esteja emocionalmente instável e em má forma física.
    Há uma série de doenças que estão directamente relacionadas com o stresse. Algumas são mais susceptíveis de afligir aqueles que estão em má forma física, enquanto outras ocorrerão naqueles que estão emocionalmente instáveis. E, claro, quem estiver em má forma física e emocionalmente instável estará em piores condições.
    O stresse crónico poderá ter como resultado a hipertensão, úlceras de estômago, problemas cardiovasculares, artrite, alergias e, possivelmente, até cancro.


    Stresse, tabaco e úlceras de estômago
    O que acontece no caso de úlceras de estômago? Na parede do estômago encontram-se dois tipos de glândulas: uma produz ácido clorídrico, a outra, muco. O ácido clorídrico é necessário para a digestão dos alimentos, enquanto o muco forma uma barreira para evitar que o ácido corroa o revestimento do estômago. Normalmente, o fluxo dos dois é equilibrado.
    Contudo, durante os períodos de stresse, a produção de ácido clorídrico poderá aumentar. Na realidade, a quantidade poderá ser tão grande, que a barreira de muco será incapaz de dar a protecção adequada. Gradualmente, o ácido quebrará a barreira e atacará o revestimento do estômago, e formar-se-ão úlceras gástricas dolorosas.
    O stresse prolongado também poderá causar danos nas células que revestem as artérias, que são unidas por juntas. 
    O stresse poderá causar o enrugamento destes pontos de junção. Isso permite que as substâncias gordas do sangue se introduzam nos tecidos internos. As provas sugerem que isso poderá iniciar o acumular de depósitos de gordura, um estreitamento das artérias e um possível ataque cardíaco.
    Antes de avançarmos mais, vamos rever algumas das respostas físicas normalmente observadas no stresse:
    1. coagulação do sangue mais rápida
    2. aumento da tensão arterial
    3. aumento do colesterol no sangue
    4. aumento de úlceras pépticas, e
    5. enrugamento do revestimento das artérias.
    Os efeitos da nicotina obtidos por fumar apenas um cigarro são muito similares aos produzidos pelo stresse. Isso significa que a pessoa que fuma, enquanto está sob stresse, está em duplo perigo.
    Uma vez que a nicotina é tratada como um stressante no organismo, e provoca reacções de alarme, porque é que os fumadores acendem um cigarro quando estão sob condições de stresse e afirmam que fumar lhes proporciona um efeito sedativo, calmante?
    Já vimos anteriormente como a nicotina estimula os centros de recompensa do cérebro. Este estímulo desperta um sentimento de relaxe e talvez de contentamento.
    Contudo, este sentimento de contentamento não é mais do que uma “ilusão agradável”. A nicotina tem, na realidade, dois efeitos. Além da ilusão agradável, também desperta as suas próprias respostas ao stresse. Por isso, fumar, na verdade, não o ajuda.
    O stresse causado pela nicotina provoca danos físicos. A ilusão agradável do fumo é apenas um “remendo” por um momento – meramente um escape induzido quimicamente que, na realidade, enfraquece, em vez de fortalecer o fumador.
    Enquanto vivermos neste mundo, haverá alturas, muitas alturas, em que teremos situações stressantes. A questão é: “O que fazer nessas ocasiões?” Há melhores soluções do que acender um cigarro.
    Sabiamente, resolveu ver-se livre do tabaco e pode ter a certeza de que fez a escolha certa.


Contudo, este sentimento de contentamento não é mais do que uma “ilusão agradável”. A nicotina tem, na realidade, dois efeitos. Além da ilusão agradável, também desperta as suas próprias respostas ao stresse. 
Por isso, fumar, na verdade, não o ajuda.
 Perguntas e respostas para gerir o stresse,
Para ultrapassar, com sucesso, os acontecimentos stressantes, tem de, primeiro, reconhecer a situação. Em vez de dizer: “Porque é que isto me aconteceu?”, tome o controlo e diga a si próprio: “O que é que posso fazer?” Isso ajudá-lo-á a analisar melhor a situação e a escolher a resposta apropriada.
    Depois, pergunte-se: “Vale a pena fumar? E, se eu fumar, isso irá ajudar-me a lidar melhor com o problema, ou será pior a emenda que o soneto?”
    As emoções, originadas por acontecimentos stressantes, podem ser expressadas ou restringidas.
    Expressar a raiva, o ódio, a frustração ou o desânimo só reforçará estas emoções. Quanto mais se faz isso, mais fácil se torna deixar vir ao de cima as suas reacções stressantes.
    Por outro lado, reprimir estas emoções poderá causar uma perturbação física. Nesse caso, o que se deve fazer?
    Aqui estão algumas sugestões que ajudaram outras pessoas, que deixaram de fumar, a lidar com emoções perturbadoras durante situações de stresse:
Não reaja de imediato. Uma situação poderá não ser tão má como parece.
Não deixe que uma situação de stresse faça surgir, em si, sentimentos de: raiva, ódio, frustração, ciúmes, depressão, tristeza ou outro parecido.
Não culpe os outros.
Não culpe as circunstâncias. E não se culpe.
Em vez disso, gaste uns momentos a pensar nas coisas. Ao reagir de maneira calma a sua mente poderá analisar melhor o problema, será mais capaz de enfrentar a situação e é provável que venha a achar a melhor solução.
 Mas, faça o que fizer, não pegue num cigarro. Em vez disso, comece a pôr em prática os princípios de que falámos anteriormente.
Ao fazê-lo, sentirá que lidará melhor com situações irritantes, terá mais gosto pela vida e, tudo isso, como não-fumador.
S&L
adaptado Luís S. Nunes
Sociólogo da Medicina e da Saúde, 
Mestre em Saúde Pública

A VÍTIMA inocente do Tabagismo

Há já mais de 30 anos, tive a oportunidade de escrever nestas páginas uma primeira abordagem acerca dos efeitos nefastos do tabaco sobre a criança, a sua vítima mais inocente. Confesso que tive então a esperança de que, já cinco anos decorridos deste século XXI, este assunto fosse apenas uma má recordação. Desde há alguns anos que a OMS em geral, e alguns países em particular (como a Noruega), tinham começado a equacionar um ano 2000 sem tabaco. Este já lá vai e tudo continua como antes!
Se, em alguns países, o tabagismo masculino conhece alguma regressão, ele tem sido substituído, cada vez mais e cada vez mais cedo, pelo tabagismo no feminino, com um concomitante aumento das doenças relacionadas com o tabaco nas mulheres e, muito naturalmente, também nas crianças.
A influência tão prejudicial do tabagismo na criança pode começar ainda antes de ela ser concebida. Na realidade, vários estudos epidemiológicos demonstram que nas mulheres fumadoras há uma frequência de esterilidade da ordem dos 21 por cento, em comparação com 14 por cento nas não fumadoras. Uma das causas será o facto da nicotina libertar certas substâncias que vão alterar os movimentos das trompas. Daí, também, a maior frequência das gravidezes tubárias nas fumadoras. Também os espermatozóides do pai podem ser afectados pelo tabaco. O seu esperma será menos rico em espermatozóides e estes terão mais vezes anomalias e menos mobilidade, por acção directa da nicotina.


Mas, uma vez o bebé concebido, os seus problemas não ficam por aí, se os pais, sobretudo a mãe, forem fumadores.
Depois do nascimento, se os pais fumam, sobretudo a mãe, a vida da criança pode ser grandemente afectada, dado que ela se torna numa fumadora passiva.
Se não, vejamos:
Se depois do nascimento a mãe fumadora amamentar o pequenino ser, como a nicotina passa para o leite materno, a sua acção nociva continua a fazer-se sentir sobre o lactente. Neste leite nicotinizado já foi encontrada nicotina na percentagem de 0,5 mg por litro. Numa mãe que tenha fumado pouco tempo antes de amamentar, a frequência cardíaca do bebé pode pas-sar dos normais 120 batimentos por minuto, para 180, com os riscos inerentes sobre um órgão tão sensível.
O risco da chamada Síndroma da Morte Súbita do Lactente é também maior com mães fumadoras e que fumaram durante a gravidez, sendo tanto maior consoante o número de cigarros fumados pela mãe. A isquemia (falta de oxigénio) fetal causada pela vasoconstrição parece ser o mecanismo que potencializa esta dramática situação.
Mas é sobre o seu aparelho respiratório que o tabagismo passivo das crianças deixa as maiores marcas. A tal ponto que surgiu mesmo uma nova patologia que, de forma muito elucidativa, dá pelo nome de “Pais que fumam, crianças que tossem”. A tosse crónica, por vezes levando ao vómito, é o seu sintoma mais frequente (73% dos casos), podendo ser acompanhada de sufocação. Vêm, em seguida, as bronquites de repetição (33%), a asma do lactente (17%), as rinofaringites (13%) e as laringites recidivantes. Notam-se, muitas vezes, sintomas de irritação aguda do aparelho respiratório, sobretudo depois de reuniões familiares (em especial ao fim de semana) em que se juntam vários fumadores: irritação nasal e das conjuntivas oculares, bronquite, traqueíte espasmódica. Estas reuniões são, também, responsáveis pela chamada síndroma da segunda-feira de manhã, bem conhecida dos professores, em que as crianças passam toda a manhã a tossir na escola.
São, também, mais frequentes nos filhos de mães fumadoras as bronquiolites agudas, tão vulgarizadas hoje em dia, em que, apesar dos riscos que lhe são inerentes, as crianças estão melhor no infantário do que em casa com uma mãe fumadora.
Outra situação que pode ser desencadeada pelo tabaco é a otite média aguda e a otite serosa, do lactente e da criança pequena. Globalmente, a taxa de otite serosa é mais elevada em 38% nas crianças submetidas ao tabagismo passivo, sobretudo por parte da mãe. Isso comprova-se pela detecção de taxas elevadas de cotinina (metabolito da nicotina), na urina das crianças afectadas. A exposição passiva destas crianças ao fumo do cigarro actua como irritante do revestimento das vias respiratórias, tendo um efeito adverso sobre os movimentos dos cílios e a consistência do muco que, normalmente, mantêm limpas estas vias.
A agravar a situação, estudos recentes demonstram que as crianças expostas ao fumo do tabaco apresentam níveis mais altos de IgE no sangue (proteína que indicia a existência de alergia), testes cutâneos mais positivos aos pólens e desenvolvem doenças respiratórias em idades mais precoces do que as que não vivem rodeadas de fumo de tabaco.
Infelizmente, nos nossos dias, a um crescente aumento do número de mães fumadoras há que juntar, logicamente, um crescente aumento de crianças que fumam, elas próprias e em idades cada vez mais precoces. Está provado que as alterações ao nível dos brônquios, verificadas nestas crianças, são tanto mais importantes e duradouras, quanto mais precocemente se iniciarem no vício. Tem sido afirmado até que estas alterações, que mais tarde podem levar a problemas graves e potencialmente incapacitantes e até mortais, como o enfisema pulmonar, serão irreversíveis, mesmo que o jovem venha depois a deixar de fumar. Basta, para isso, que fume 5 ou mais cigarros por dia.
Igualmente, a criança ou o adolescente que fuma vê o seu rendimento escolar diminuído, sendo o uso do tabaco factor importante de insucesso escolar. Igualmente, o tabagismo juvenil produz deficiências vitamínicas, perturbações da nutrição e desajustamentos mentais e sociais. Pode ser também a plataforma de lançamento de outras toxicodependências, ainda mais
graves, como a marijuana e mesmo as drogas duras.
Muito mais haveria a dizer se mais espaço houvesse. Apenas mais uma referência à acção do tabaco no aparelho digestivo do jovem, com diminuição das secreções do pâncreas e aumento da alcalinidade do duodeno, factores que contribuem para as frequentes úlceras duodenais da adolescência.
Por último, não queremos deixar de falar nos perigos do cigarro como causador de incêndios de que, tantas vezes, as crianças são as principais vítimas. Estima-se que o cigarro seja o causador de 45% de todos os fogos e de entre 22-56% das mortes por fogos domésticos. A maior parte dos cigarros contêm aditivos, quer no papel quer no tabaco, que lhes permitem arder até durante 28 minutos, quando deixados sozinhos.
A juventude é a idade da imitação e os jovens dos nossos dias vivem e procedem cada vez mais como o grupo em que se integram. É necessário ser quase um herói para recusar o cigarro que os colegas lhe estendem, sobretudo porque o hábito de fumar é por muitos considerado como uma forma de libertação e de afirmação pessoal.
Haverá sempre crianças a fumar enquanto houver adultos que o façam. Que moral têm um pai ou mãe para aconselharem o filho a não fumar quando eles próprios fumam? Mas o tabagismo, quer passivo quer activo, é um grande risco para a criança e para o jovem. Se o melhor da vida é a criança, desafio todos os pais que me lêem a libertarem os seus filhos que um dia hão-de nascer, que estão para nascer ou que já nasceram e estão a crescer, deste terrível flagelo. SL 

Bibliografia

- Nelson: “Textbook of Pediatrics”
- Oski: “Principles and Practice of Pediatrics”
- Cadernos de Imuno-Alergologia Pediátrica
- Maria da Conceição Granate: “ Fumar e ... Adoecer”
– Samuel Ribeiro: Projecto “Tabaco ou Saúde”, “ o Tabaco e o Cancro do Pulmão” (1963) e “Saúde e Lar” (1973, 1979 e 1985).

Samuel Ribeiro
Pediatra

Vantagens em Deixar de Fumar


Após um acidente cardiovascular agudo, a suspensão do tabaco faz com que o risco de se ter novo acidente se reduza para 50%.
Estima-se que em Portugal, segundo dados da Fundação Portuguesa de Cardiologia, existam cerca de 23% de fumadores, ou seja que em cada 4 pessoas, 1 seja fumadora, com predominância no sexo masculino, embora esta relação se esteja a alterar pelo facto de as raparigas estarem a fumar mais que os rapazes, o que é extremamente preocupante, porque a associação pílula e tabaco traz  riscos vasculares muito acrescidos.
A maioria dos fumadores começa a fumar na adolescência, estimando-se que cerca de 80% dos fumadores comece a fumar antes dos 18 anos. Só nos EUA, segundo dados da American Heart Association (AHA), 3000 jovens começam a fumar diariamente e, destes, 1000 morrerão um dia de doença cardiovascular.
O tabagismo, considerado pela AHA como fazendo parte das toxicodependências (a par das outras dependências), foi associado durante longos anos ao prazer e à libertação do “eu”. Posteriormente, foi reconhecido, pela comunidade médica internacional, que era nefasto à saúde e foi associado às doenças pulmonares, como o cancro do Pulmão, a Bronquite Crónica e o Enfisema Pulmonar.
Sabe-se, já há vários anos, desde a publicação do Estudo Framingham na década de 70, que o tabagismo tem malefícios muito mais vastos, tendo uma relação directa com as doenças cardiovasculares. Qualquer fumador corrente, tem um risco muito mais acrescido de vir a ter problemas graves no seu sistema vascular, sendo que a Sociedade Europeia de Cardiologia considera “Fumador Corrente” qualquer pessoa que tenha fumado no último ano 1 ou mais cigarros por dia.
A Nicotina induz, por efeitos directos, um  aumento da Pressão Arterial e da Frequência Cardíaca e constrição das artérias. Mas a nicotina não é o único elemento nefasto no cigarro. Também o monóxido de carbono entra no sangue e reduz a quantidade de Oxigénio disponível para o coração e outras partes do corpo. O tabaco interfere ainda com a função das plaquetas (elementos do sangue que servem para parar uma hemorragia) e acelera a sua agregação, fazendo com que o sangue se torne mais espesso, e coagule mais facilmente.
Para além destes efeitos directos, o tabaco acelera os outros factores de risco que sabemos terem uma relação directa com a aterosclerose (as placas intravasculares): agrava a hipertensão arterial, baixa o colesterol “bom”.
Assim sendo, o tabagismo é um factor de aterosclerose, e é considerado por todas as Sociedades de Cardiologia um “factor  major” de doença cardiovascular, a par da Hipertensão arterial, da Diabetes, da Dislipidémia, da Obesidade. A probabilidade de se formarem placas de aterosclerose aumenta de forma exponencial à medida que os vários factores de risco vão estando associados. As artérias vão ficando progressivamente obstruídas, menos elásticas, e acabam por ocluir em territórios diversos,  como  o Cérebro, o Coração ou os Membros inferiores. As consequências poderão ser catastróficas: os indivíduos podem ficar paralisados, sem fala, ou terem que ser amputados dos seus membros.
Está hoje claramente comprovado que o Tabagismo está fortemente associado ao Enfarte Agudo do Miocárdio, à Morte Súbita de origem cardíaca e ao Acidente Vascular Cerebral (AVC).
O Registo Nacional dos Síndromas Coronários Agudos, realizado pela Sociedade Portuguesa de Cardiologia, mostra que cerca de 31% dos Portugueses que têm um Enfarte Agudo do Miocárdio ou uma Angina Instável,  são fumadores activos (segundo o relatório de 2003).
O indivíduo que fumar 1 maço de cigarros /dia tem um risco duas vezes superior de ter um ataque cardíaco que um não fumador.
Um indivíduo que já tenha tido um acidente cardiovascular agudo e continue a fumar tem um risco muito mais acrescido de ter um novo acidente que um indivíduo que tenha parado de fumar, e tem  um risco muito maior deste novo acidente ser mais extenso e ter consequências mais graves que o primeiro.
Está claramente demonstrado que o parar de fumar reduz o risco vascular.
Independentemente do tempo que se fuma, o risco cardiovascular começa logo a baixar quando se pára de fumar. Um ano após a interrupção, o risco de ataque cardíaco reduz-se  para cerca de metade.
Após um acidente cardiovascular agudo, a suspensão do tabaco faz com que o risco de se ter novo acidente se reduza para 50%. Todavia, neste caso, só após 15 anos de interrupção o risco é comparável ao de um indivíduo que nunca fumou, tais são os malefícios do tabaco.
Não se deve esperar então por ter um ataque cardíaco ou um AVC para se decidir parar de fumar. Esta fase é já tardia. Deve-se parar de fumar enquanto se está a tempo. Deve-se parar de fumar agora!
Esta tarefa pode não ser fácil, os médicos sabem que não é. A par da dependência física da nicotina, existe toda uma vertente psicológica que é difícil de contornar. Para deixar de fumar é preciso muita motivação, muita força de vontade, e é este o factor decisivo. SL
 

Independentemente do tempo que se fuma, o risco cardiovascular começa logo a baixar quando se pára de fumar. Um ano após a interrupção, o risco de ataque cardíaco reduz-se  para cerca de metade.
Madalena Carvalho
Cardiologista